Data: 11 de abril
A Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) divulgou, e faço questão de repercutir neste espaço um assunto que muito nos importa. Médicos, enfermeiros e outros profissionais da área de saúde lideram o ranking de acidentes ocupacionais no Brasil. Parece um contrassenso, mas esses profissionais, que trabalham em ambientes que favorecem a ocorrência de doenças infectocontagiosas, provocadas por agentes biológicos e pela contaminação, carecem de programas de gestão de risco ocupacionais mais eficazes.
Segundo Rafael Torres, médico do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, “as condições do trabalho e da saúde dos médicos são negligenciadas. Há várias questões envolvidas nessa negligência, desde a postura dos médicos, altamente resistentes aos exames periódicos, até aspectos da organização do trabalho com um número excessivo de horas trabalhadas, na maioria das vezes, de forma autônoma”, explica. O quadro refletido está diretamente relacionado à questão cultural, pois o profissional de saúde, “esquece” da própria saúde. “Somos ‘treinados’ para diagnosticar, medicar, aconselhar e prevenir doenças na população, e é sempre mais fácil analisar um caso quando não estamos envolvidos diretamente”, explica Torres.
A influência sobre a maior incidência de doenças ocupacionais entre os profissionais de todos os setores, especialmente os da área de saúde, pode ser apontada pelo aumento das horas trabalhadas e do número de vínculos. “A organização do trabalho e as relações entre o profissional e o meio em que está inserido contribuem de maneira significativa para o adoecimento”, destaca.
O fato de liderar o ranking das doenças laborais é tão insólito, que a ANAMT já colocou o tema no painel temático do congresso da área que ocorrerá em maio, “Cuidando de quem cuida”. Também será debatido no evento “As condições de trabalho e da saúde dos profissionais de saúde do setor público e privado”. Aliás, quando ressalto que é necessário haver uma gestão competente para preservar os profissionais de doenças e acidentes de trabalho, chego ao ponto delicado do problema: falta recursos para a saúde e sucateamento dos serviços públicos, que acabam expondo os trabalhadores dos serviços a riscos biomecânicos e psicossociais, além de potencializar o risco biológico.
Marcelo Pustiglioni, médico do trabalho, explica que enfermeiros, seguidos pelos médicos e estudantes (residentes e estagiários) são os grupos de trabalho mais expostos aos riscos. Mas, o pessoal da higienização e limpeza também aparece nas estatísticas. Isso por causa das falhas no descarte de material contaminado e porque, ao se acidentarem, é muito difícil identificar o paciente-fonte e isso complica muito a decisão de quimioprofilaxia.
Entre os principais acidentes de trabalho em serviços de saúde, destacam-se aqueles com exposição ao material biológico, particularmente sangue e secreções. Seja os veiculados por material perfurocortante, como agulhas e lâminas, seja por respingos em mucosas, como os olhos e a boca, ou soluções de continuidade na pele, como cortes e feridas. Pustiglioni convoca o governo a fazer a parte de legislar e fiscalizar de maneira competente. Pois é, quando o problema está apenas nas mãos da iniciativa privada, a solução pode ser difícil, mas não é impossível, agora, quando o assunto está por conta do estado/governo, o ceticismo é que prevalece, com a solução do problema ficando bem mais difícil. Não vou mentir!
(Fonte: Blog Emily Sobral)