Em decisão unânime, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) condenou a empresa Anicuns Álcool e Derivados a pagar uma indenização a um cortador de cana que trabalhou por longos períodos sob o sol de uma plantação em Goiás. A decisão, que pode render um ressarcimento de até R$ 50 mil, muda o entendimento sobre o assunto nos tribunais regionais, que usarão o despacho do tribunal superior para indenizar funcionários que tiveram a saúde comprometida por exposição solar prolongada.
Joselino Joaquim da Silva, 56, trabalhava na cidade de Adelândia, em Goiás, cortando cana sob um sol de até 30ºC em safras e entressafras. Ele chegava à lavoura antes das 8h e encerrava as tarefas às 16h.
“A exposição excessiva ao sol pode trazer muitos problemas de saúde, como desidratação e desequilibro dos eletrólitos, como sódio, potássio e cloro”, explica Fabio Mario Mariotti, médico do trabalho na clínica especializada MCompany. “Sem o equilíbrio desses componentes, o organismo não funciona bem.”
Os advogados do funcionário defenderam na Justiça que o Ministério do Trabalho prevê intervalos de 30 minutos a cada meia hora de serviço pesado em lugares com temperatura entre 26ºC e 28ºC. Como seu Joselino não recebia autorização para esse descanso, a defesa pediu o pagamento de adicional de insalubridade e horas extras em uma indenização que pode chegar a R$ 50 mil.
“O TST agora vai devolver o processo para a Vara do Trabalho de Inhumas (GO), onde os contadores farão o cálculo definitivo da indenização”, afirmou ao UOL Fabrício Vargas dos Santos, um dos advogados do caso.
Em sua contestação, a Anicuns alegou que a determinação do Ministério não se aplica às atividades no corte manual de cana-de-açúcar nem contempla atividades a céu aberto, e afirmou que fornecia equipamentos de proteção. O Tribunal Regional do Trabalho chegou a excluir o pagamento das horas extras por entender que a regulamentação não prevê o direito aos intervalos para “recuperação térmica”.
Em recurso ao TST, no entanto, o relator do caso, ministro Alberto Luiz Bresciani, considerou que o trabalho realizado além dos níveis de tolerância ao calor gera o direito não apenas ao adicional de insalubridade, mas também aos intervalos para recuperação térmica previstos pelo Ministério do Trabalho.
O ministro também lembrou que o trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura prevê a concessão de pausas para descanso em atividades realizadas necessariamente em pé e que exijam sobrecarga muscular. Essas pausas, segundo o relator, integram a jornada de trabalho.
“Qualquer trabalhador sem proteção pode desenvolver doenças crônicas”, diz o médico. “Sem o fornecimento de protetor solar com certificação, a exposição prolongada à radiação pode causar câncer de pele. Acompanhei casos de plantadores de uva com melanoma (o tipo mais perigoso de câncer de pele) na testa, no nariz e ombros. O descanso é imprescindível para algumas profissões.”
O advogado do trabalhador rural espera que o despacho em favor de seu cliente mude as decisões em varas e tribunais regionais. “O entendimento do TST vai gerar precedentes que vai beneficiar muitos trabalhadores rurais. Quem trabalha em serviço pesado sob o sol tem agora o direito ao intervalo térmico.”