Auditores-Fiscais do Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho em Minas Gerais – SRT/MG apresentaram na manhã desta quarta-feira, 25 de setembro, o relatório de investigação do maior acidente de trabalho do Brasil, o rompimento da barragem da Vale na Mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG). O acidente completa hoje 8 meses. Morreram 249 pessoas, a maioria de empregados e terceirizados da Vale, além de moradores da região afetada pelos rejeitos da barragem. Até hoje, 21 pessoas estão desaparecidas. Foram também lesionados 64 trabalhadores.
A apresentação ficou sob a responsabilidade dos Auditores-Fiscais do Trabalho Marcos Botelho e Mário Parreiras. Também estavam presentes representantes do Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e da Advocacia Geral da União. A coletiva de imprensa atraiu jornalistas dos principais veículos de Belo Horizonte. As reportagens estão sendo publicadas em jornais de TV, rádios e em sites de notícias.
A equipe que fez a investigação foi composta por oito Auditores-Fiscais do Trabalho. Eles foram ao local do acidente seis vezes, entrevistaram representantes de empresas responsáveis por projetos, execução de obras, auditorias e estudos técnicos relativos à barragem. Também examinaram centenas de documentos, além de se reunirem com integrantes dos Ministérios Público Federal e do Trabalho, Agência Nacional de Mineração, Corpo de Bombeiros e Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Vários documentos foram obtidos por meio de autorizações judiciais e cedidos pelos Ministérios Públicos Estadual e do Trabalho.
No relatório de cerca de 400 páginas, foram apontadas nove causas para o acidente de trabalho. Os problemas remontam à época da construção da estrutura, em 1976. A principal causa apurada pelos Auditores-Fiscais do Trabalho foi a linha freática muito alta. Em outras palavras, havia muita água na barragem e a drenagem era insuficiente para escoá-la. De acordo com a investigação, não foram adotadas as medidas efetivas para baixar o nível da água. As atividades da mina deveriam ter sido paralisadas desde 2016 e a população que estava no caminho da lama deveria ter sido avisada do risco que corria.
As nove causas apontadas foram distorções no cálculo dos fatores de segurança, geologia local desconhecida, operação irregular – lançamento de rejeitos e largura de praia, sistema de drenagem – interno e superficial – insuficiente e mal conservado, demora no rebaixamento efetivo da linha freática, existência de anomalias recorrentes, falhas em planos de emergência, auscultação deficiente – piezômetros, inclinômetros, e gestão de segurança e saúde no trabalho precária.
Desde a construção, em 1976,o dique inicial da barragem não contava com sistema de drenagem. Outro problema é que a praia de rejeitos de 150 metros, no mínimo, somente começou a ser formada em 2012. Em meados de 2015, a praia contava com 100 metros, ainda bem menor que o necessário.
A fiscalização constatou o lançamento inadequado de rejeitos na barragem, provocando o acúmulo de água na frente do barramento. “Isso foi formando camadas sobrepostas, acumulando água sobre as camadas de materiais mais finos, a argila. Em vez de a água infiltrar nas camadas de rejeito já lançadas, começa a ser jogada para frente, para perto do barramento, criando os chamados lençóis empoleirados próximos aos diques”, explicou Botelho.
Esse processo dificultava a drenagem. Como exemplo, Marcos Botelho disse que se, em junho de 2017, quando o nível de água chegou a um ponto crítico, se a Vale fosse bombear toda a água para fora da barragem, ao ritmo de 229,5 metros cúbicos por hora – m³/h, levaria o ano todo para chegar num nível aceitável de segurança. Se fosse mantido um ritmo de 98,1 m³/h, o prazo saltaria para fins de 2018.
Mas a Vale não adotou essa medida, como também outras que foram apontadas por empresas de consultoria em dezembro de 2017, como: perfurar poços de rebaixamento; criar uma berma de estabilização; lavrar a barragem, removendo mais de 40 metros de altura em três etapas; retaludamento dos diques; retaludamento junto com uma berm de reforço.
A opção da Vale foi implementar Drenos Horizontais Profundos – DHP. Foram projetados 29, mas apenas 14 foram executados. “Quando o 15º DHP estava sendo executado, a água injetada durante a perfuração encontrou resistência e voltou para o próprio maciço, fraturou o dique inicial, e escorrendo sobre uma escada de drenagem. A Vale então paralisou essas intervenções e procurava outras soluções. E as diretorias da Vale tinham conhecimento de tudo isso. Fizeram o projeto de poços profundos para rebaixar a linha d`água, mas não tiveram tempo para implementar”, afirmou Marcos Botelho.
Durante a análise de relatórios da Vale, os Auditores-Fiscais do Trabalho encontraram padrões que se repetiam a cada 15 dias. Entre eles, havia assoreamento de canaletas, trincas, vazamentos com presença de rejeitos, indicando que se formavam vazios dentro da estrutura. A praia ficou coberta de vegetação retendo a água ao invés de escoá-la como era sua função. Cupinzeiros e formigueiros abriram furos no barramento. Uma bomba de água não funcionava. E, por fim, o volume de chuvas em 2018 foi 62,3% maior que aquele registrado em 2015, o que provocou elevação da linha freática. As sondagens feitas para monitorar as condições da barragem podem ter sido o gatilho que provocou a liquefação da estrutura.
Além de todos os problemas citados, a investigação constatou maquiagem dos números dos fatores de estabilidade constantes nos relatórios de auditoria, na tentativa de obter a Declaração de Condição de Estabilidade – DCE junto aos órgãos fiscalizadores.
A Vale não se pronunciou sobre o relatório alegando que ainda não teve acesso aos dados.
(Fonte: Sinait)