Os acidentes de trabalho atualizados pelo AEPS (Anuário Estatístico da Previdência Social) 2020 já estão disponíveis no site do Ministério do Trabalho e Previdência. Os números revelam queda de 24% nos acidentes de trabalho em todo o Brasil em comparação ao ano anterior. Em 2020 ocorreram 445.814 acidentes contra 586.857 em 2019.
O número total de acidentes com CAT (Comunicação de Acidentes de Trabalho) registrada também caiu para 403.694 acidentes, 17,2% a menos do que em 2019. A mesma tendência ocorreu com os acidentes sem CAT, que ficaram em 42.120 e uma redução de 57,5% em comparação a 2019.
Para o advogado com formação em SST pela OIT, Orion Sávio Santos de Oliveira, atual coordenador-Geral de Benefícios de Risco e Reabilitação Profissional na Secretaria de Previdência do Ministério do Trabalho e Previdência, várias questões poderiam ser apontadas para explicar as estatísticas que, segundo ele, refletem o momento atípico vivido em virtude da pandemia de Covid-19.
“Podemos certamente afirmar que a pandemia afetou de forma relevante todos os aspectos da vida moderna no mundo e isso se refletiu fortemente na forma como as atividades econômicas se organizaram no período e consequentemente nas estatísticas de acidentes de trabalho”.
Entre os pontos que podem ter influenciado diretamente nas estatísticas recentemente divulgadas, Orion destaca que durante o ano de 2020 várias localidades decretaram regras rígidas de isolamento social e fechamento de estabelecimentos empresariais, adotando-se em muitas situações, o trabalho remoto. “Este fator foi um dos que contribuiu para o movimento anormal ou suspensão das atividades em que acontecem os acidentes típicos e de trajeto. Ademais, a dinâmica das atividades econômicas foi alterada, motivo pelo qual podemos notar variações anormais em determinadas CNAEs, que podem ter tido uma redução acentuada no volume de notificações ou um aumento inesperado, como é o caso do setor de saúde”, reforça o coordenador-Geral. Além disto, Orion enfatizou também a suspensão dos contratos de trabalho implementada pela Medida Provisória nº. 936, de 1º de abril de 2020, posteriormente convertida na Lei nº. 14.020, de 2020, quando muitos vínculos permaneceram suspensos durante o ano de 2020.
Os dados do AEPS ainda mostram que o total de acidentes típicos reduziu 16,4%, passando de 375.300 em 2019 para 313.575 em 2020. Nos acidentes de trajeto o percentual de redução foi 41,9%, pois em 2019 aconteceram 102.405 casos contra 59.520 em 2020.
Doenças ocupacionais
Contrariando a tendência de queda verificada pela maioria dos dados acidentários, nos casos de doenças ocupacionais houve um aumento expressivo de 204,9%, saltando de 10.034 casos em 2019 para 30.599 em 2020. “Tivemos um ano totalmente atípico em 2020, com um aumento de aproximadamente 205% nas doenças do trabalho notificadas, o que pode indicar forte influência do adoecimento por COVID-19. Considerando somente as ‘CIDs B34.2 – Infecção por coronavírus de localização não especificada’ e ‘U07.1 – Infecção pelo novo Coronavírus’, tivemos 22.309 registros como doença do trabalho no ano de 2020, o que parece estar coerente com o aumento observado nas estatísticas”, destaca Orion.
Liquidados
Ainda conforme os dados do AEPS, houve queda de 25,6% na quantidade de acidentes liquidados em 2020. Esse percentual representa 155.134 acidentes liquidados a menos do que os liquidados em 2019. Também houve diminuição de 12,1% no número de mortes no trabalho, com 1.937 óbitos em 2020 contra 2.203 em 2019.
Os casos de assistência médica caíram 1,4%, passando de 105.036 em 2019 para 103.556 em 2020, e o total de afastamento por menos de 15 dias, que diminuiu 19,4%, o que representa 72.498 casos a menos em 2020. Já o total de afastamentos por mais de 15 dias, diminuiu 61,2%, sendo que em 2020 foram 42.331 contra 109.156, em 2019. Ainda no âmbito dos benefícios líquidos chama a atenção o número total de incapacidades permanentes que reduziu bruscamente em 84,9%. Assim, em 2020 foram pagos 2.491 benefícios por incapacidade permanente contra 16.556 pagos em 2019.
Conforme Orion, a redução dos benefícios por incapacidades permanentes, decorre principalmente da Lei nº. 13.982, de 2 de abril de 2020, que em seu artigo 4º, autorizou o INSS a antecipar um salário-mínimo para os requerentes do benefício. “Como as atividades presenciais no período foram suspensas, inclusive para avaliação da incapacidade, a antecipação foi a política utilizada. Não houve avaliação da incapacidade nesse período (temporária ou permanente), mas apenas o adiantamento do benefício até que a incapacidade pudesse ser avaliada, o que parece ser o lógico haja vista a temporariedade do contexto pandêmico vivido, no qual era necessário assegurar a renda do segurado no primeiro momento. Este é um dos fatores que contribuíram para redução de benefícios por incapacidade permanente, embora outros fatores com certeza possam ter contribuído, como a redução de acidentes típicos e de doenças”, reforça o coordenador-Geral.
Setores
Outro ponto em destaque no AEPS são os seis setores de atividades econômicas em que mais ocorreram acidentes de trabalho em 2020. Em primeiro lugar estão as atividades de Saúde e Serviços Sociais, totalizando 79.930 acidentes; em segundo, o Comércio e Reparação de Veículos Automotores, com 65.470; em terceiro, Produtos Alimentícios e Bebidas, com 40.174; em quarto, Transporte, Armazenagem e Correios, com 28.219; em quinto lugar, as atividades de Serviços Prestados Principalmente a Empresa, com 27.592 acidentes; e, em sexto, a Construção, com 26.342. “É fundamental aguardar e avaliar as estatísticas do ano de 2021 e também do ano de 2022 para que somente então possamos compreender melhor o cenário que estamos vivendo, pois a forma com que a distribuição dos acidentes de trabalho se comportar nestes próximos anos será um importante indicativo de eventuais mudanças na dinâmica do mercado de trabalho, por exemplo em virtude da adoção do trabalho remoto de forma ampla”, finaliza Orion.
Fonte: Revista Proteção