ANAMT e ALMET realizam Fórum Virtual sobre Pessoa com Deficiência – Enquadramento, Inclusão e Acessibilidade

Avanços e desafios da Lei Brasileira de Inclusão, Políticas afirmativas para as Pessoas com Deficiência e diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista foram os três temas abordados no primeiro dia do Fórum Virtual ANAMT/ALMET, sobre o tema geral “Pessoa com Deficiência – Enquadramento, Inclusão e Acessibilidade”, realizado nos dias 12 e 13 de julho. Esta é a segunda edição do Fórum em 2024, em parceria com as federadas. A primeira foi realizada em conjunto com a SBMT, nos dias 15 e 16 de março, e a terceira e última, programadas para 13 e 14 de setembro, será em parceria com a ANAMT-ES.

A abertura do Fórum contou com Dra. Rosylane Rocha, diretora científica da Associação. “É mais uma iniciativa da ANAMT de estar junto com as suas federadas, para realizar encontros científicos conjuntos, levando conhecimento, conteúdos sempre com temas relacionados com a nossa prática médica diária”, destacou a diretora.

Sobre o tema principal do evento, ela ressaltou a importância, na prática da medicina do trabalho, da inclusão e dos procedimentos de adequação para que as pessoas com deficiência possam ter oportunidades de forma equânime com outras pessoas numa relação de trabalho.

“O olhar e a expertise, a técnica do médico do trabalho nessa avaliação é muito importante, porque leis nós temos no país, mas precisamos que os médicos tenham conhecimento sobre a legislação, sobre os critérios clínicos, epidemiológicos, porque essas pessoas com deficiência tem limitação permanente e precisam enfrentar barreiras na sociedade para terem igualdade de participação plena. O papel do médico do trabalho, com toda a sua técnica e toda a sua sensibilidade é muito importante’, pontuou a diretora científica.

Também na abertura, Dr. Anderson de Moura, diretor científico da ALMET, evidenciou a importância do tema. “Sabemos que a realidade das pessoas com deficiência muitas vezes é oculta para as pessoas em geral. Para o médico do trabalho é um desafio grande, sobretudo porque nós que fazemos a avaliação,” salientou.

Por sua vez, Dra. Marilurdes Monteiro Barros, presidente da ALMET, disse que é preciso falar mais sobre o tema. “Precisamos entender a importância do médico do trabalho para proporcionar essa inclusão que está lá na Lei, mas que precisamos saber aplicar. É todo um cuidado para que os critérios de justiça sejam bem empregados”, acentuou a médica.

Lei da Inclusão

A conferência do gestor Flávio Pereira dos Santos, presidente do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CODDEDE) detalhou a importância da Lei 13.146/2015, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), seus avanços e desafios. “A criação da LBI oportunizou a mudança de um paradigma social. O estabelecimento de uma legislação tem esse viés de realmente trazer uma mudança social, uma mudança institucional a que ela se compromete em atingir, ou seja, as pessoas que necessitam dessa legislação para a própria mudança de vida”, frisou.

Durante a exposição, o especialista contou sua própria experiência a partir do diagnóstico de paralisia infantil, aos dois anos. “Venho de uma época que havia muita precariedade na vida das pessoas com deficiência”, relatou ao contar as dificuldades enfrentadas por falta de uma legislação objetiva e clara que permitisse às pessoas com deficiência exercer não só a sua cidadania, mas seu pleno desenvolvimento social e pessoal.

“A lei por si só não vira uma chave”, refletiu o gestor. “O grande avanço da LBI foi levar a sociedade a refletir sobre os direitos, não apenas como algo da lei, mas algo social, uma mudança de modelo, onde as pessoas conseguem finalmente ter acesso não apenas a benefícios, a serviços, mas a ter acesso igualitário às ações e às atividades que sociedade oferece”, reforçou o palestrante ao exemplificar a adaptação do transporte público. “A adaptação não é um privilégio. É acessibilidade de uma pessoa. É garantir o direito de ir e vir”, acentuou o conferencista, que detalhou diversos pontos para entendimento do tema.

Políticas afirmativas

A primeira mesa-redonda do dia abordou ‘Políticas Afirmativas para Pessoa com Deficiência’ e contou com três palestrantes: Dra. Emilyanna Rodrigues, diretora científica da ABRAMT; Dra Lailah Vilela, auditora Fiscal do Trabalho no Ministério do Trabalho e Dr. Manoel da Costa Neto (SE), chefe da Unidade de Saúde Ocupacional e Segurança do Trabalho da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).

Dra. Emilyanna palestrou sobre o tópico ‘Conceitos de PCD – Evolução Histórica e Conflitos entre normas’. Na ocasião, ela apresentou um quadro cronológico sobre a evolução histórica da legislação voltada à pessoa com deficiência, contextualizando o momento atual. “A primeira vez que se falou sobre os direitos da pessoa com deficiência foi na Constituição Federal de 1988, mas ainda não tínhamos uma conceituação clara”, explicou. A seu ver, a Convenção da ONU, em 2008/2009, sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi um marco histórico para a causa. Outra lei importante citada foi a 8.213/91, lei das cotas para garantir a inclusão de PCD no mercado de trabalho, além da lei 13.146 (LBI). “Antes, o critério de avaliação era pautado nas condições físicas ou psicológicas e não na interação da pessoa”, destacou a médica.

A segunda apresentação ficou a cargo da Dra. Lailah Vilela, que falou sobre ‘Avaliação e enquadramento de PcD para fins de cotas de emprego’, com foco na inclusão de pessoas com deficiência no trabalho. Ela apresentou dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, do IBGE, referente a 2022. Segundo esses dados, 18,6 milhões de brasileiros são de pessoas com deficiência com dois anos ou mais. Esses números, que representam 8,9% do total da população, derrubam a argumentação falha que as empresas apresentam à fiscalização alegando que não existem pessoas com deficiência para trabalhar, segundo a palestrante.

“Tem mais de nove vezes a quantidade necessária para cumprir a cota inteira da Lei 8.213. Esse não é o motivo real. A grande barreira é o capacitismo. Acham que a pessoa com deficiência não dá conta e querem contratar para postos com menor qualificação profissional. Existem dois milhões de pessoas com deficiência com ensino superior, mestrado, doutorado e esses são os mais excluídos”, pontuou a auditora.

Para encerrar o tópico, o Dr. Manoel da Costa Neto expôs o tema ‘Avaliação Subjetiva versus Critérios Clínicos’. A palestra iniciou com a apresentação do laudo padrão, preenchido com as características da doença e sua origem, se é congênita, doença, acidente, adquirida, sempre com anexação de provas. Como não seria possível apresentar todas as deficiências, o especialista expôs os critérios clínicos da avaliação da deficiência visual e seus desdobramentos e incluiu um caso real para exemplo.

“Sempre que me deparo com um candidato(a) buscando enquadramento para fins de cotas, procuro o documento caracterizador de deficiência do Ministério do Trabalho e Emprego que tem sempre todos os critérios para cada tipo de deficiência que precisamos”, indicou.

Na palestra, ele também falou dos novos modelos de avaliação que deverão ser adotados em breve, como a avaliação biopsicossocial da deficiência, modelo de avaliação única para a concessão de benefícios, avaliação multiprofissional, coleta de informações da pessoa avaliada, entre outros pontos. “Essa abordagem será necessária nos novos modelos de avaliação e para atendimento da nova lei que será proposta em breve”, afirmou.

Espectro autista

A última mesa-redonda tratou sobre ‘Transtornos do Espectro Autista’, com dois palestrantes. Dr. Fábio Barbirato, chefe do Ambulatório de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Santa Casa do Rio de Janeiro, falou sobre os ‘Aspectos clínicos e diagnósticos para enquadramento de PCD. Em seguida, Dra. Janaína Dias, doutora em Psicologia Cognitiva pela UFPE, abordou a ‘Neuropsicologia: entendendo a aplicação do teste de avaliação do comprometimento’.

Dr. Barbirato falou sobre o complexo desenvolvimento dos pacientes com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), o que envolve atrasos e comprometimentos nas áreas da interação social e linguagem, apresentando uma ampla gama de sintomas emocionais, cognitivos, motores e sensoriais.

Quando o paciente com autismo chega à vida adulta, terá uma série de comprometimentos, não consegue interagir, por exemplo. O que caracteriza o autismo tem muito haver com o mundo social, com inadequação social muito expressiva, como indicou o psiquiatra. Segundo explicou, existem muitas mudanças conceituais e na terapêutica, mas ainda falta conceito mais claro para a neurodiversidade.

Na apresentação, ele tratou sobre a classificação do autismo e falou sobre outros diagnósticos como TDH, Síndrome do Pânico e outras manifestações. E reforçou que, para avaliar o autismo, tem que compreender que vem desde a infância.

Na apresentação seguinte, Dra. Janaína Gaia apresentou o tópico ‘Neuropsicologia: entendendo a aplicação do teste de avaliação do comprometimento’. A exposição começou pelo conceito de neuropsicologia, campo das neurociências que busca compreender a relação entre cérebro, cognição e comportamento. “Quando falamos da psicologia para o desenvolvimento envolve não só a criança, mas o adolescente, o adulto e o idoso”, pontuou a psicóloga.

Para ilustrar o tema, ela apresentou recortes de imagens para a compreensão da conectividade funcional, evidenciando as diferenças entre o cérebro de um autista e de uma pessoa com desenvolvimento típico.

Apresentou também os diversos instrumentais utilizados na avaliação neuropsicológica, de acordo com a faixa etária, para prevenção precoce de transtornos do desenvolvimento.

 

O segundo dia do Fórum Virtual ANAMT e ALMET teve início com a conferência A Perícia Médica Como Ciência e Arte na Garantia dos Direitos Sociais e na Proteção da Sociedade, ministrada por Dr. José Freire, presidente da Associação Brasileira de Medicina Legal e Perícia Médica (ABMLPM). Ele falou sobre o trabalho da perícia médica sob a perspectiva de conceitos como justiça, verdade e conhecimento científico, assim como de aspectos tecnológicos como nanomateriais e inteligência artificial. Ele destacou que, além das outras especialidades médicas, outras áreas de conhecimento têm relação com a medicina pericial, como o Direito e a Economia.

Em seguida, foi realizada a conferência Perícia Médica Administrativa: Avaliação e Enquadramento de PcD. Dra. Gilvana Campos, diretora de Legislação da ANAMT, abordou o tema Deficiência Física: Avaliação sob Critérios Clínicos e Científicos. Ela destacou os textos legislativos que asseguram direitos e diretrizes para avaliação dessas pessoas, além de promoverem a acessibilidade, como o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e leis do Distrito Federal, como a Lei nº 6.637/2020.

Aspectos como a realização de uma anamnese detalhada e histórico familiar do paciente estão entre os aspectos a serem observados, além de exames físicos e complementares, avaliações neuropsicológicas e interdisciplinares estão entre os procedimentos mencionados. Sobre os peritos, Dra. Gilvana destacou a importância dos profissionais estarem atualizados sobre as mudanças na área.

Sob a perspectiva da deficiência auditiva, Dr. Carlos Santana, diretor científico da Sociedade Baiana de Medicina do Trabalho (SBMT), falou sobre os critérios para detectar perda auditiva e os tipos existentes. Ele destacou a Lei 14.768/2023, que considera pessoa com deficiência indivíduos com perda unilateral total e bilateral (parcial ou total). Por ser recente, a aplicação do texto gera dúvidas e a orientação é usar a literalidade da lei.

Dra. Andrea Gomes, oftalmologista do Hospital de Olhos Santa Lúcia, tratou da deficiência visual. Ela abordou os critérios que definem a acuidade visual, assim como o histórico de leis sobre o tema, existentes desde a década de 1960. A especialista também falou sobre a Lei 14.126/2021, que enquadra a visão monocular como deficiência, e os testes realizados na avaliação dos pacientes e a importância da função do perito ao avaliar adequadamente cada caso.

Direitos da PcD: Políticas Afirmativas e o IFBrM foi o assunto tratado na conferência seguinte, que contou com palestras de Alexandre de Castro, diretor de Interpretação de Libras da Secretaria Extraordinária da Pessoa com Deficiência (SEPD), que falou sobre Políticas Afirmativas para PcD no Brasil. O palestrante destacou que, de acordo com o Censo 2010, há mais de 46 milhões de pessoas com deficiência no Brasil, o que torna um desafio grande trazer políticas públicas em diversas áreas com igualdade de oportunidades a todos.

Além de legislações específicas, como a Lei de Cotas e a participação social por meio de iniciativas como as Conferências Nacionais dos Direitos dos PcDs, Alexandre falou da importância da Medicina do Trabalho na avaliação das capacidades e limitações de cada um. No âmbito das empresas, a relevância de iniciativas como implementação de políticas de diversidade e treinamentos para sensibilizar todos os trabalhadores para o assunto foram destacados. Ele ainda pontuou iniciativas da SEPD, como programas de inclusão social e profissionais, além de apoio educacional para qualificação das pessoas com deficiência.

O Instrumento de Funcionalidade Brasileiro Modificado (IFBrM) foi abordado por Raul de Paiva, coordenador-geral de Diversidade e Interseccionalidade da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Ele falou sobre a ferramenta, validada cientificamente pela UnB em 2018, que é derivada da CIF de 2002, abrangendo 7 dos 10 domínios originais da mesma. Atualmente, há pilotos para a implementação da mesma no Piauí e, em breve, no Ceará e Bahia. A partir dessas experiências, se pensará em uma matriz única para o Brasil. Para se tornar um avaliador do Instrumento, será necessário realizar um curso prático e teórico. Além disso, ao fim da avaliação, pretende-se elaborar um plano de políticas individualizado com os direitos que a pessoa em questão tem.

Inteligência Jurídica das Avaliações Médico Periciais, foi o último assunto abordado no Fórum, apresentado pela juíza titular da 30ª Vara Cível da Capital (TJ-AL), Isabelle Coutinho Sampaio. Ela explicou que a maioria dos juízes segue os laudos dos peritos ao julgarem casos relacionadas a pessoas com deficiência, apontando a importância dos mesmos. De acordo com a palestrante, benefícios assistenciais para PcDs foi o quarto tema de processo mais recorrente em 2023, assunto mais comum relacionado ao assunto que chega aos profissionais, o que também pode implicar em tentativa de acesso indevida aos benefícios.

Diante desse quadro, ela destacou outros assuntos que poderia ser mais recorrentes nos processos, como constatação da deficiência para ingresso no serviço público, acesso à educação e reserva de cargos em empresas privadas. A palestrante ainda falou sobre o fato de Projetos de Lei sobre o tema não constarem a avaliação de funcionalidade, o que torna os processos de avaliação heterogêneos. Segundo ela, a maioria das avaliações judicias são feitas com base em diagnósticos exclusivamente de doenças, agravos e sequelas, já que perícias multidisciplinares são caras.

 

Por |2024-07-16T16:51:29-03:0016 de julho de 2024|Institucional, Notícias|Comentários desativados em ANAMT e ALMET realizam Fórum Virtual sobre Pessoa com Deficiência – Enquadramento, Inclusão e Acessibilidade