A Agenda de Desenvolvimento Sustentável Pós-2015 da ONU, também chamada de Agenda 2030, delineou os objetivos estratégicos dos países membros da organização para o avanço de uma série de indicadores. Trata-se de um documento ambicioso e o papel da Medicina do Trabalho neste cenário foi abordado na Conferência Pan-Americana de Saúde do Trabalhador e Ambiental – Rio 2018.
Professor Titular do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da USP, Marco Akerman apontou que, apesar do compromisso firmado, muitos países seguem justamente o caminho contrário ao que foi estabelecido na ONU. No caso do Brasil, ele ressaltou a forma como as mudanças legislativas referentes ao trabalho e saúde do trabalhador vão justamente na contramão do estabelecido.
“Hoje, não estamos utilizando evidências científicas para direcionar as políticas de saúde para o trabalhador. Globalmente, o que tem funcionado? A regulação e o cumprimento da lei em matéria de saúde e segurança no trabalho, por exemplo”, apontou. “No entanto, seguimos justamente na direção contrária: com cortes, com contratos temporários e precarização do trabalho, com o trabalho em domicílio – todos reforçados na Reforma Trabalhista”.
Chefe-médico da British Petroleum (BP) e cofundador da International Occupational Medicine Society Collaborative (IOMSC), Dr. Richard Heron ressaltou o caminho apontado Akerman, dizendo que a pesquisa científica e o uso de dados referentes às mudanças no ambiente de trabalho devem servir como parâmetro para mudanças nas políticas públicas. Ele também incentivou as associações de Médicos do Trabalho de todo o mundo a pautar seus esforços pela Agenda 2030.
“Foi assim que os navegadores descobriram a América, por exemplo. Você tinha como base de informação para o curso dos navios as estrelas e, sempre que esse rumo mudava, era feito um ajuste. No caso das políticas públicas, não é diferente. Devemos analisar os impactos, captar informações e redefinir o rumo”, reforçou. “E não devemos nos deixar desmotivar pela falta de visibilidade que o nosso trabalho tem, muitas vezes”.
Na mesma conferência, a ex-presidente da Associação Latino-americana de Saúde Ocupacional (ALSO) e subdiretora do Instituto Nacional de Saúde do Trabalho do México, Dra. Elia Enríquez Viveros, indicou que esse cuidado com o futuro do trabalhador não diz respeito apenas às mudanças sociais, mas também ao próprio negócio de grandes empresas. A especialista apresentou indicadores sobre saúde no trabalho na América, indicando a necessidade da América Latina precisar se esforçar para alcançar o padrão global de saúde no trabalho em comparação com Estados Unidos e Europa.
“Há uma correlação comprovada entre empresas que promovem um ambiente de trabalho seguro e se preocupam com a saúde dos seus trabalhadores e empresas com bom desempenho em seus negócios”, destacou Viveros. “Não há riqueza nos negócios sem saúde para o trabalhador”.
A inclusão do trabalhador com deficiência
A inclusão do trabalhador com deficiência foi tema da conferência de Dra. Daniela Bortman, presidente da comissão de Inclusão e Diversidade da ANAMT. Em sua apresentação, a especialista falou sobre a avaliação da funcionalidade do trabalhador com deficiência e ressaltou que o fato dela precisar se posicionar a respeito do assunto mostra que as empresas precisam aprender o real significado da inclusão.
“A avaliação da funcionalidade do trabalhador com deficiência deveria ser igual à avaliação de qualquer outro trabalhador, deveria ser algo visto com normalidade pelo profissional de saúde no trabalho. Mas, infelizmente, não é o que acontece no mercado”, apontou a especialista. “Hoje, há não há uma mentalidade de que a pessoa com deficiência deve ser inclusa no ambiente do trabalho como parte efetivamente integrante dele, e sim de forma assistencialista e muito focada na limitação”.
Dra. Daniela falou ainda sobre o conflito entre a tentativa do Médico do Trabalho de garantir a segurança da pessoa com deficiência ao mesmo tempo em que precisa incluí-la integralmente no ambiente de trabalho. “Existe uma linha tênue entre a segregação e a proteção. Muitas vezes na tentativa de proteger o trabalhador com deficiência, o Médico do Trabalho lhe impõe restrições que não lhe permitem integrar-se à empresa”, avalia.